quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Uma noite de observações

Marcado com uma semana de antecedência o dia D finalmente chegara. O tempo não prometia muita coisa, mas mesmo assim estávamos preparados. Ricardo prometeu levar o seu Newtoniano de 180mm até a minha casa para que eu pudesse observar o céu com o seu telescópio. Mas havia uma condição - eu deveria desenhar um mapa, pois ele não conhecia o bairro em que moro. Quase todos os dias que antecederam aquela data de 29 de agosto de 2008, ele me cobrava o tal mapa e eu continuava procrastinando. Afinal, eu já havia dito várias vezes que não sou bom com mapas, mas ele continuava a insistir. Por fim, resolvi por os neurônios para funcionar. Resultado - desenhei o mapa perfeito. Não tinha como não errar!

Entrando numa rua errada aqui e outra ali, por causa do meu mapa; telefonando um minuto sim e outro também, Ricardo finalmente conseguiu chegar. Logo após estacionar o seu "Astromóvel" e reclamar muito devido ao mapa, pegamos todo o seu equipamento e levamos lá pra cima, para o local de observações. Assim que Ricardo subiu percebeu que a luz de um poste, que antes não existia ali, poderia nos atrapalhar. Com isso, a seção de reclamações recomeçou! Revoltado, ele até mesmo me acusou de ter feito propaganda enganosa sobre o local! Mas é isso mesmo. Um bom Astrônomo deve ser paciente. Afinal, o que eu poderia ter feito? Se eu desse vazão à ira poderia ter usado a base do seu telescópio de outra maneira - contra ele mesmo, e ele poderia ter uma tremenda dor de cabeça, e as observações iriam para o espaço!

O INÍCIO DA OBSERVAÇÃO

Após montar o telescópio, uma das primeiras coisas que notamos foi uma certa nebulom7asidade que estava ofuscando as estrelas menos brilhantes. Mas mesmo assim começamos a procurar a constelação de Lyra. Este era o objeto que estava no topo da nossa lista. Mas a tal nebulosidade estava dificultando a sua localização. Como se não bastasse, apareceu uma nuvem naquela direção. Daí resolvemos apontar o telescópio para Escorpião. Ricardo resolveu focalizar M7. Não há quem não fique maravilhado com a beleza deste aglomerado!

Messier 7 (M7) ou NGC 6475 é um aglomerado aberto de estrelas, isto é, um agrupamento de algumas dezenas de estrelas organizadas assimetricamente, próximas ao plano galáctico. Consiste de aproximadamente 80 estrelas de magnitude maior que 10 e tem idade estimada em torno de 220 milhões de anos.

Em seguiredspotda apontamos o telescópio para Júpter. Ele é o quinto planeta a partir do Sol e o maior de todos. Júpiter tem duas vezes mais massa que todos os outros planetas juntos (318 vezes a massa da Terra). Ficamos por um tempo observando Júpiter com sua GMV (Grande Mancha Vermelha). Júpiter é o quarto objeto mais brilhante no céu, depois do Sol, Lua e Vênus. É impressionante a beleza deste planeta! Confesso que Júpter é um dos meus planetas favoritos.

DE VOLTA À LYRA

Apontamos novamente o telescópio para Lyra. A nuvem já havia 445px-Lyra_constellation_mapsaído, mas aquela atormentadora nebulosidade ainda persistia! Realmente, estávamos com dificuldades. A nebulosidade atrapalhou tanto que até Vega parecia apresentar uma magnitude bem menor, como se ela estivesse se disfarçando em outra estrela! Por algum tempo chegamos até mesmo a duvidar se aquela era realmente Vega! Desci até meu "escritório" e abri o Starry Night para tirar aquela dúvida que tanto persistia. Como a nebulosidade estava camuflando muitas estrelas, fazendo com que algumas constelações perdessem sua forma, tracei as coordenadas exatas de Vega tomando Júpiter como referencial. De acordo com o Starry Night Vega estava numa separação angular de 62° de Júpiter e 26° acima da linha do horizonte. Quando subi e medi os graus no céu, percebi que as coordenadas estavam coincidindo. Sim, estávamos realmente observando Vega, na Lyra. 587px-M57_The_Ring_Nebula

A esta altura talvez você esteja se perguntando: "Mas por que esta obsessão por esta constelação?" Acontece que Lyra abriga uma das mais belas nebulosas - a do Anel! Esta nebulosa, também conhecida por M57 ou NGC 6720, fica a 2.300 anos-luz da Terra. Está entre os mais notáveis exemplos de nebulosa planetária. Esse nome - Nebulosa do Anel - se deve ao fato de seus gases realmente parecerem com um anel.

MANEIRA INUSITADA DE SE FOCALIZAR UM AGLOMERADO

Visto que estávamos investindo muito tempo tentando focalizar a M57, DSC00582reduzida resolvemos nos concentrar em outros objetos, enquanto esperávamos a nebulosidade desaparecer. Peguei meus binóculos e comecei a vasculhar o céu. Enquanto eu observava Sagitário e a Coroa Austral e Ricardo observava só Deus sabe o quê, ele percebeu que não estava conseguindo localizar os objetos corretamente. Tentando desesperadamente descobrir o que estava acontecendo ele percebeu que a objetiva da sua buscadora estava suja! Problema resolvido, recomeçamos as observações com o telescópio. Visto que Lyra ainda estava camuflada na nebulosidade voltei a observar M7 enquanto Ricardo, por sua vez, vasculhava os céus com os meus binóculos. Neste ínterim o celular tocou. Levei um baita susto! Afinal, eu estava por demais concentrado na M7. O autor do susto foi Rogério. Ele estava ligando para avisar que não viria mais, pois o plantão foi muito duro. Ele havia realizado duas cirurgias e terminou tarde. Ele realmente estava com muita vontade de vir, mas ele não poderia realizar as cirurgias às pressas! Imagine se ele fizesse isso e esquecesse algum bisturi, canivete, facão, serrote ou outra ferramenta qualquer dentro do paciente! Meu Deus! Dá um frio na espinha só de pensar!

Após assegurar-lhe que lamentávamos a sua ausência, ele prometeu comparecer na próxima. Passei o celular para Ricardo. Enquanto ele conversava com Rogério falando sobrm6e as nossas dificuldades e o que estávamos fazendo para contornar a situação, voltei para o telescópio e quando dei uma olhada pela ocular percebi algo estranho. Pensei: "Essa não é a M7!" Quando me detive por mais alguns segundo observando, percebi que, na realidade, estava olhando para M6! Isso mesmo! No momento do susto, minha mão bateu no telescópio e o mesmo passou a focalizar este aglomerado!

Assim como M7, Messier 6 ou NGC 6405 é um aglomerado aberto de estrelas organizadas de maneira assimétrica, cuja idade estimada é em torno de 100 milhões de anos. M6 é também conhecido como o Aglomerado da Borboleta, uma vez que o arranjo das estrelas sugere uma borboleta de asas abertas.

'O CÉU NÃO ESTAVA PRA PEIXE!'

A vontade de observar a Nebulosa do Anel ainda persistia. Resolvemos fazer a última tentativa da noite. Observamos atentamente; medimos os graus; analisamos outras possibilidades, mas não tinha jeito mesmo. Decidi deixar Lyra e M57 para outra oportunidade. Ricardo resolveu fazer o mesmo. Mas, inconformado, ele resolveu tirar a "prova dos nove". Ele tirou uma foto em longa exposição daquela área, para poder compará-la depois com a imagem fornecida pelo Starry Night. A imagem abaixo é a foto que ele tirou sobreposta na imagem tirada do Starry Night. E a que conclusão as suas investigações levaram? "Estávamos realmente apontando o telescópio para o lugar certo!", disse ele.

IMG_0745 copy

Enquanto nos preparávamos para desmontar todo o equipamento, conversávamos sobre o que faríamos da próxima vez que fôssemos fazer nossas observações. Enquanto conversávamos surgiu o que parecia ser uma estrela de magnitIMG_0753_copy_cropreduzidaude tal que superava Vênus! Seria um novo planeta? Uma estrela? Segundos depois parecia mais uma estrela dupla. Mas não era nem uma coisa e nem outra. Aquilo não era nada mais que um avião! Resolvi brincar um pouco. Peguei o telescópio e apontei para o avião. Impressionante! À olho nu só víamos seus faróis, mas olhando pelo telescópio parecia que ele estava bem próximo de nós! Dava pra ver até mesmo as demais luzes de suas asas! Ricardo gostou da brincadeira e enquanto outros aviões passavam ele tentava focalizá-los!

Embora tivéssemos vontade de continuar, aquela nebulosidade não nos deixava em paz. Foi aí que eu pensei: "O céu não está pra peixe"! É realmente notável como uma nebulosidade pode atrapalhar! Ela conseguiu frustrar nosso plano de observar a Nebulosa do Anel. Mas, mesmo não conseguindo observar M57, aquelas horas que passamos observando os céus foi muito gratificante. Pelo menos aprendemos várias lições. Uma delas é se preparar melhor para tirar o máximo de proveito da observação. Cada minuto é precioso e a única maneira de aproveitar cada minuto gasto em observações é se preparar antecipadamente! Esperamos que todos os nosso planos para nos reunir dêem certo. Esperamos que o nosso grupo cresça e se fortaleça cada vez mais. Esperamos poder crescer juntos e esperamos poder fazer muitas outras observações e em muitos lugares diferentes para que juntos possamos continuar nesta Jornada nas Estrelas! - por Douglas Tude.

3 comentários:

Ameríndio disse...

Muito bom seu texto, cara... Divertidissimo. Interessante.

Vou adicionar aos meus favoritos e ler mais , depois!

:)

isa antares disse...

Amei seu texto Douglas!aprendi e dei bastante risadas também;ficou muito bom.Agora eu vou te dar um conselho muito sério:amanhã,acorde bem cedinho e vá ao oftamologista mais próximo,porque confundir um avião com um astro,bichinho,nem eu que tenho dez graus de miopia em cada olho...
continue escrevendo assim,viu?
beijos
Isabela****

Douglas Tude disse...

Obrigado Isa e Obrigado Rafa pelas palavras, mas é muita bondade da parte de vocês! Que bom que vocês gostaram!
Eu já sei que Isa já da casa. Mas e você Rafa? Por que não se asssocia ao nosso grupo de observações? Sinta-se à vontade, ok? Um foríssimo abraço.